O que é Tantra? Segunda Parte
- Dharmabodhi
- May 30, 2017
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Tantra é a ciência espiritual, religião e cultura desenvolvida ao presente estado de refinamento pelos yoguins e filósofos da Índia e da Ásia Central. De forma resumida, o Tantra é fundado no princípio de que você pode acordar para sua verdadeira natureza inata e ser livrado do sofrimento confuso para um estado de êxtase iluminado não-dual por meio da transmissão. A transmissão do nosso estado de iluminação pode ser recebida do Guru/Lama de cada um ou pela deidade. O Guru/Lama é visto como uma lâmpada da iluminação que acende nossa própria lâmpada de iluminação inata. Uma vez acesas, ambas as lâmpadas irradiam a mesma energia de iluminação. Tal transmissão pode ser recebida via olhar, sonho, toque, palavras (recebendo ensinamentos) ou diretamente de mente-a-mente.
Por sua vez, o Tantra é um caminho de prática espiritual que afirma a vida ao ensinar que é desnecessário renunciar ao mundo e suas energias para se espiritualizar. Na realidade é pensado que seria altamente desvantajoso fazer isso. O praticante de Tantra vê através da ilusão de um mundo populado com objetos individualizados, diretamente adentrando na real aparência-natureza temporária de todos os fenômenos mundanos. Estabelecer-se nesta visão da realidade como realmente é destrói o apego e a aversão em suas raízes e, por consequência, o sofrimento confuso. Livre de apego e aversão o tantrika (praticante tântrico) torna-se capaz de reconhecer o mundo como uma manifestação divina.
O jornada do yoguin via Tantra rumo à iluminação envolve a completa integração com o Universo de forma e não-forma, além da dissolução de qualquer limitação conceitual. Tantrikas não buscam um “céu” localizado em algum lugar além em um plano transcendental. A ininterrupta Atenção-Consciente (Awareness) e Êxtase (Bliss), inatas à nossa natureza iluminada, formam a base do universo, sendo tal base compartilhada por todos os seres sencientes. Nossa natureza iluminada pode ser descoberta no “aqui e agora” e não é uma recompensa no pós-morte por seguir as leis de um deus. Este é o caminho do Tantra.
A título de exemplo, estes são alguns dos métodos que os tantrikas utilizam para atingir iluminação: meditação, yoga do sonho, yoga da morte, ritual, Kundalini-Hatha Yoga, prostrações, cantos, orações e etc...Tais métodos podem ser utilizados em conjunto ou não, dependendo das aptidões e tendências de cada praticante.
Existem formas de Tantra que são duais, semi-não-duais e não-duais em sua orientação e existem diversas escolas dentro de cada uma dessas categorias. Na modalidade não-dual a realidade suprema é irrestrita e absoluta Atenção-Consciente Amorosa (Loving Awareness). Irrestrita Atenção-Consciente Amorosa é a iluminação. A suprema Atenção-Consciente Amorosa espontânea e ininterruptamente emana todas as diversas formas do Universo (humanos, deuses, planetas, espaço, objetos, energias...etc) dentro de si mesma. O Universo de formas na realidade não é separado da realidade suprema mas tão somente aparenta ser. O caminho do Tantra é re-experienciar a unidade essencial de todos os fenômenos aparentemente emanados como nada exceto Atenção-Consciente, ilimitada e sem forma fixa.
A realidade suprema da Atenção-Consciente Amorosa é também muitas vezes denominada Shiva, Shakti, Samantabhadra, Kuntunzangpo, Vajradhara, etc.., dependendo da tradição tântrica que você segue. Entretanto, personificar, simbolizar ou nomear a realidade suprema em nenhum aspecto a limita, ou mesmo nos possibilita percebe-la (grasp) por completo. A realidade suprema é sempre além de formas e nomes, sendo a base primordial de emanação de todas as formas temporárias do universo. Quando nós diretamente experienciamos nossa verdadeira natureza e quando ininterruptamente permanecemos nela, dizemos ser iluminados, absolutamente livres de quaisquer condicionamentos, sempre reagindo de forma espontânea e apropriada ao contexto. Diferentemente de outros processos de potencialização humana, como o Tantra utiliza tanto energias sutis e densas como a transmissão vinda de forma inquebrável por uma linhagem de mestres iluminados, é dito nos textos que a iluminação pode ser alcançada em uma única vida, ou no pós-morte.
Algumas características do Tantra Clássico:
Rituais envolvendo deidades para desenvolver virtudes.
Mantras sementes (bija).
Visualização e auto-identificação com a deidade.
Necessidade de iniciação (para acumular energias), segredo e esoterismo.
Importância do Guru / Lama / Acharya.
Importância da mandala e yantra.
Transgressão e antinomia (ética).
Reavaliação do Corpo (sabedoria do Universo em si mesmo) / Corpo de Shiva.
Mulheres têm status mais elevado e papéis especiais / Repositórios de energia.
Analogias de pensamentos, sentimentos e ações.
Reavaliação de estados mentais negativos.
Maioria de praticantes de tradição familiar ou pessoas normais (ao contrário de monges) / Vida monástica vista como não sendo natural para maioria.
Método rápido de iluminação, em uma vida.
Aspectos mundanos são tornados divinos (família, trabalho e interações sociais).
Princípios do Tantra Não-Dual
Não existem objetos separados, só o campo fundamental de espaço ilimitado. Este campo absoluto de consciência, imutável e sem forma, o puro observador é visto como o princípio masculino denominado Shiva em algumas tradições.
Este campo fundamental pode ser experienciado como Atenção-Consciente Amorosa (Loving Awareness).
Todas as manifestações surgem constantemente. A energia da manifestação temporária e forma, bem como a tonalidade amorosa de tais manifestações é vista como o princípio feminino.
A energia manifesta (mundo de formas e sensações) não obscurece nossa habilidade de experienciar a nosso campo fundamental / base.
Seres humanos são de forma inata um com este campo, mas podemos nos sentir separados devido ao auto-foco (self-focus).
Seres humanos têm o potencial de perceber e experienciar sua união com o universo. Os métodos que são utilizados para tal empreendimento são denominados Dharma.
Todas as formas que surgem são temporárias.
As formas e energias não afetam a base / A Essência / o campo fundamental não evolui.
Corpo, mente e energias são na realidade uma coisa.
Nossa aparente vida individual está interconectada com todo o universo.
Nós temos a livre escolha de cultivar maior congruência com a Natureza, ou o contrário.
Quando estamos em harmonia com a Natureza, nós cultivamos maior longevidade.
Quando em conflito experienciamos sofrimento, morte prematura ou separação.
Nosso nascimento ocorre no contextos dos ciclos maiores da Natureza.
Nosso nascimento é único e cheio de multitudes.
Cada pessoa tem um caminho e chamado únicos (nadi), que a serem seguidos criam harmonia com a Natureza.
Quando queremos o caminho (nadi) de outra pessoa, nós não fortalecemos nosso próprio caminho e criamos sofrimento.
A saúde suprema não é perfeição e ausência de morte, mas sim harmonia com os ciclos maiores que constantemente nos suportam e nutrem.